sexta-feira, 9 de março de 2012

Quim Barreiros: um cantor de intervenção

Dizem que o Quim Barreiros é maldoso, mal intencionado e um porco. Também dizem que eu sou insensível e que a Betty Grafstein é uma mulher. Não acredito em nada disso. Aliás, acredito mais que existe alguém cujo primeiro nome seja Onofre do que o Quim Barreiros ser maldoso.

Pelo contrário, o Quim Barreiros, através da sua música, expõe e reflete acerca das principais temáticas e problemas sociais da era moderna. Toda a gente fala no Zeca Afonso, no Kurt Kobain e no José Figueiras como cantores de intervenção, mas sabem quem fala no Quim Barreiros? NINGUÉM! Não quero acreditar que seja uma atitude discriminatória  só por ele ter bigode ou por tocar o mesmo instrumento que os romenos tocam em esplanadas só para chatear as pessoas. Já agora, o José Figueiras era cantor de intervenção por denunciar o isolamento do tirolês. Ele foi uma espécie de 'Grito do Ipiranga' lá dos gajos.

Mas afinal, porque é o Quim Barreiros um cantor de intervenção?

Tenhamos em consideração a mensagem que emana de algumas das suas músicas e vejamos quão profundos são os valores que se pretendem passar.

  • «Ketchup»: como sabemos a alimentação dos portugueses é desequilibrada. A obesidade é um fenómeno facilmente observável na sociedade e as 'leggins' vieram acentuar essa visibilidade. Quando Quim Barreiros pergunta «queres ketchup, Maria?» acentua claramente esses hábitos poucos saudáveis na alimentação quotidiana dos portugueses através da ironia. Essa ideia de ser a população geral é enfatizada com os nomes Manel e Maria, tal como podia ser o Carlos e a Carla ou eu e a minha prima. Além disso, esta música mostra a importância da divisão de tarefas domésticas, visto que o Manel e a Maria foram às compras juntos.

  • «Mestre da Culinária»: Quim Barreiros assassina com esta música o tradicionalismo latente na sociedade. O homem pode e deve cozinhar, assim como a mulher pode e deve votar. O homem na cozinha não é algo contra-natura, a não ser que cozinhe todo nu ou que não lave as mãos. Mais, o estereótipo de que quem gosta de cozinhar é homossexual também cai: «convido minhas amigas, para comer e para dançar», algo que pode fazer porque é «solteiro e bom rapaz» e vive «num apartamento», querendo uma «panela de pressão, para ver se cozinho mais depressa», precisamente para dar boa impressão às moças, outro drama do homem atual. E não é com decotes para homem ou com calças verdes que se consegue isso, mas sim a cozinhar depressa.

  • «Tira a Roupa»: «Tira a roupa, tira a roupa, que já está a anoitecer. Tira a roupa, tira a roupa do estendal que vai chover». Mais uma vez, o mito do homem desinteressado nas tarefas domésticas cai. É o homem quem avisa a mulher de que vai chover e que se deve tirar a roupa do estendal. Mais, ao dizer «meu amor, eu tiro as calças e tu tiras as calcinhas, vai tirando as tuas roupas que eu vou tirando as minhas», promove a justa divisão de tarefas, tantas vezes esquecida pelos verdadeiros mal intencionados do Mundo. E o empenho nesta tarefa é tal que trata a mulher por «meu amor», algo que só me disseram uma única vez na minha vida e foi quando liguei para uma linha erótica.

  • «Aeroporto de Mosquito»: «Aeroporto de mosquito, capacete espacial, o careca tem cabelo na nunca e na lateral»; «cabeça de lua cheia»; «parece uma bola de bilhar». São coisas destas que se ouvem ao longo da música, na qual Quim Barreiros mostra o drama da calvície, drama esse acentuado pelas atitudes preconceituosas face a quem sofre disso. O cantor mostra, através do exagero, o ridículo que é ser-se preconceituoso face à calvície. Pena não haver uma música assim em relação aos estúpidos, já que essa ia ser a música da minha vida.

  • «Os ovos»: «Ela berrou comigo e me mandou embora, só porque deixei os ovos do lado de fora». Além de acentuar a mudança do paradigma social, em que as mulheres passam a estar em maior número nas posições de chefia, Quim Barreiros acentua a precaridade do emprego da era moderna, capaz de haver despedimentos sumários ao mínimo erro, deixando a pessoa no desemprego e remetendo-o a ser um daqueles moços que faz a barba de 15 em 15 dias.

  • «Garagem da vizinha»: Para terminar, a mais completa de todas. Quim Barreiros reflete sobre o drama do divórcio na sociedade moderna, que é algo que acontece às pessoas próximas de nós («lá na rua onde eu moro conheci uma vizinha, separada do marido e está morando sozinha»). Mais, num período psicossocial claramente marcado pelo individualismo e egoísmo, surge um exemplar da bondade humana, que «vendo meu carro na chuva, ofereceu sua garagem». Esta bondade é mútua, rompe com o interesseirismo adjacente ao ser humano, já que ele também apara o jardim à porta da garagem da mulher. Esta música é também o espelho da sociedade atual, nomeadamente com o homem a ter que acumular dois empregos para ganhar um pouco mais para sobreviver, mesmo que seja a vender cocos, algo que se compra numa mercearia ou frutaria, mais depressa do que a um gajo que os vende num atrelado.

Em suma, por tudo isto se prova que, ao contrário do que se propaga nos meios de comunicação, Quim Barreiros tem profundidade nas suas músicas, as suas letras passam mensagens que são como um espelho da sociedade mas que, simultaneamente, funciona como uma crítica feroz a essa mesma sociedade moderna, através das suas músicas. Menos na do «Chupa Teresa», que aí ele excedeu-se e foi grande porco. Principalmente porque não existem gelados de abacaxi. E se houvesse só podia ser um Pirulo.

2 comentários:

  1. e que intervenção...se bem que a tua foi bem mais profunda...
    Anónima MR

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  2. Já agora, o Quim barreiros participou num disco do Zeca afonso. É verdade, vão pesquisar e vão ver!! Abraço

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