Não há situação mais embaraçosa que ir num elevador com vizinhos ou desconhecidos. Nessa situação, das duas uma: ou vai haver um silêncio constrangedor durante uns eternos 30 segundos ou alguém vai sentir a necessidade de dizer alguma coisa e vai falar sobre o tempo. «Hoje está sol.», «Parece que parou de chover de vez», «Rais'parta a chuva nunca mais acaba», «Este calor arrasa uma pessoa», «Ouvi dizer que numa ocasião, foi um Inverno tão rigoroso que nasceu um urso polar na Serra da Estrela». Esta última é provavelmente a menos usada, mas todas as outras são frequentes.
Falar num elevador sobre o tempo foi uma grande estratégia ao início, era um tema descomprometedor, toda a gente tem opinião sobre o calor e o frio, o sol e a chuva, o vento e a trovoada. Mas, tal como se gostar muito de Chipicaos e comer-se um, todos os dias, durante 5 anos, falar sobre o tempo com todos os vizinhos e desconhecidos em elevadores desgasta e torna-se cansativo. Por isso, agora que chegamos às 6 mil visualizações no blog temos que ser úteis em alguma coisa (mesmo que alguns desses 6 mil cheguem cá através de pesquisas no google um pouco duvidosas) e decidi começar por fazer serviço público.
Tendo em conta que na televisão, na rádio e principalmente nos elevadores, se está sempre a falar sobre o tempo, vou deixar aqui uma lista de temas que podem surgir como tópicos de conversa em elevadores, para aqueles que não suportarem um silêncio constrangedor nem queiram falar outra vez sobre o tempo:
- Talhos e o preço da carne. Falar sobre talhos tem muito que se lhe diga, seja pelas preferências, se se gosta mais dos bifes finos ou grossos, de peru ou de frango, seja pelo paradigma do talho moderno que vende rissóis de pescada ou seja pelo preço da carne, que ora sobe, ora desce. Menos o preço das almôndegas, que está igual há 15 anos;
- Começar perguntas por «sempre é verdade que ...?» e depois inventar qualquer coisa na hora, só para fazer conversa, tipo «sempre é verdade que o Rei do Uzbequistão mandou incendiar todas as plantações de feijão?». A outra pessoa vai dizer que não sabe e perguntar porque é que ele fez isso. Entretanto ou um dos dois sai no seu andar e a conversa fica por ali ou dizes algo do género «não sei, eu ouvi isso por alto, mas posso ter percebido mal», só para ganhar tempo;
- Falar sobre a selecção nacional dá sempre resultado. Nunca sabemos de que clube uma pessoa é, mas mesmo aqueles que dizem que não gostam de futebol vêem a selecção (aliás, principalmente os que dizem que não gostam de futebol vêem a selecção) e dá sempre para um minuto de conversa, suficiente para aguentar a viagem de elevador;
- Como é feita a manutenção do elevador, se está actualizada, será que cumpre as normas de segurança e será que o condomínio está a par? Este tema resulta bem em prédios, quer para passar o tempo, quer para as pessoas evitarem ir contigo no elevador e ires à vontade. O bom disto é que não tens que dar respostas, só de disparar perguntas para o ar e o tema vai surgir;
- Promoções de supermercado. Este é um daqueles que resulta com todos, só tens de adequar os produtos à faixa etária. Aos jovens falas nas promoções na cerveja, aos adultos falas nas promoções nas latas de atum ou no café e aos idosos falas nas promoções no leite ou no chá. Às moças em geral falas nas promoções que há no chocolate. Para este tema tens sempre que roubar um exemplar da Dica da Semana de algum prédio que ainda os receba;
- Falar do que se comeu uma vez num restaurante. Nem é preciso que se tenha ido lá recentemente, basta ter-se ido uma vez e ter-se gostado de algo que se comeu. Se a outra pessoa conhecer o restaurante, falam de outros pratos, se não conhecer o protagonismo é teu até chegar o teu andar. O melhor disto é que se a conversa for interrompida a meio, retomas na próxima viagem de elevador;
- Para idosas, tenta ver a capa da TV7 Dias ou da TV Guia e comenta alguma notícia de lá. Para idosos, tenta ver a capa do Jornal de Notícias ou do Correio da Manhã e traz alguma coisa à baila. De certeza que vais gerar algum comentário que vai ocupar a viagem toda e ainda te vão considerar um moço simpático;
- Qualquer que seja a população que apanhes no elevador, falar de doenças é sempre uma boa forma de ocupar o tempo, só tens que adaptar o discurso e a doença para a faixa etária. Ou então, se fores num elevador com várias pessoas, espera que alguém introduza o tema do tempo e tu arranjas maneira de relacionares alguma doença com o tempo que está;
- Desgraças. O Mundo está cheio de desgraças: ou é tsunami no Japão, ou terramoto na Turquia, ou mineiros soterrados no Chile, ou guerra na Líbia ou o marido da Juliana, que era pedreiro no Curdistão e entretanto foi despedido porque eles lá agora precisam mais de soldados que de pedreiros. As pessoas adoram falar de desgraças e de manifestar pena, basta informares-te sobre o que se passa no mundo para teres tema de conversa num elevador.
Ouvi dizer que ainda há prédios privilegiados que ainda recebem a Dica da Semana, semanalmente e à segunda-feira. No meu prédio nunca mais recebemos esses exemplares e então tenho que roubar do prédio em frente para saber se é uma boa semana para comprar pepinos ou se devo esperar mais uns dias pela promoção. Ou será que é algum vizinho que nos anda a roubar as revistas mal as põem no chão do prédio? Aposto que é o lixeiro novo, que quando cá andava o Pina nunca tinham desaparecido Dicas da Semana, mas agora este novo deve levá-las a todas. Ouvi dizer que este lixeiro novo está a cumprir trabalho comunitário por ter esfaqueado o Pina numa discoteca, por causa de uma dívida de 20 contos de uns comprimidos que o Ramalho Drogas lhes tinha orientado. Coisa feia. Mas como vêem, é fácil conversar de coisas sem ser sobre o tempo.
P.S.: Claro que vocês não querem ser daquelas pessoas chatas que até evitam em partilhar o elevador com elas. Imagino se o Jorge Abel vivesse num prédio, toda a gente a deixá-lo apanhar o elevador sozinho senão já sabiam que ele ia falar sobre tintas e sobre como a política de contratações da Robialac é imbatível mas ao mesmo tempo desprezível, porque desfalca as empresas de tintas honestas como as do patrão dele. Juro, até eu quando tenho que ir com ele de elevador digo que ressuscitei um trauma de infância e que voltei a ter medo e então vou de escadas. Assim, se ele me seguir, posso ir a correr e escusamos de falar.
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