Algum espertinho irá dizer, com entoação de desdém e de desprezo, que as mercearias do futuro são os super-mercados. Nada mais errado. Os super-mercados são como aqueles grandões na escola que gostam da mesma moça que um moço normal e que então, sempre que vêem esse moço com algum poema ou uma caixa de chocolates para dar à moça, vão lá, dão-lhe um tareão e ficam com as prendas para dizer que foram eles que deram. Nunca percebi como é que as moças não descobriam que os grandões não tinham complexidade mental para escrever um poema, quanto mais para comprar uma caixa de chocolates. A verdade é que, à custa disso, ainda hoje não sei escrever poemas e por isso é que a minha professora de Português nunca me deu mais que 12.
Mas o que quis dizer com este raciocínio é que os supermercados não inventaram nada. Apenas juntaram as mercearias, os talhos, as peixarias e as padarias no mesmo espaço e chamaram-lhes «super-mercado», ainda que alguns mercados municipais e feiras sejam muito maiores que alguns «super-mercados» que andam para aí. Odeio super-mercados. E ainda odeio mais quando tenho que lá ir buscar alguma coisa e há sempre 3 ou 4 filas cheias de gente mas, no fim, acabo por escolher sempre a que anda mais devagar e depois não posso mudar a meio porque os que estão atrás já estão mesmo em cima de mim. Ao menos sempre que vou à mercearia do Rebelo posso esperar 2 horas para que ele me registe um Chipicao, mas ao menos nessas duas horas estou ali a ouvir metáforas sexuais e histórias de quando ele era mestre de traineira.
Assim, como voltar a atrair pessoas às mercearias? Inovando-as. As pessoas gostam é de inovação, mesmo que seja para pior. Ao menos é moderno! Por exemplo, não acredito que alguém goste de andar com roupa cor-de-rosa mas é moderno e inovador, então todos andam. Nem quero pensar mais nisto. Vejam lá algumas ideias que eu tenho para as mercearias do futuro:
- Haver uma secção de drogas. Não como as drogarias tipo a do Sr. Daniel, pai do Ramalho Drogas, que apesar do nome sugestivo só vendem pentes, vassouras e colheres de café. Vendiam mesmo drogas, de todo o tipo. Assim, era escusado andar-se à procura de alguém que nos pudesse enganar ou entregar à polícia. Toda a gente sabia que eram drogas que se vendiam ali mas a polícia nem se incomodava muito em lá ir, só quando o dono da mercearia atrasasse o pagamento dos impostos ou à polícia;
- Uma boa mercearia teria que ter uma secção dedicada a uma gama variada de serviços. Esses serviços eram profissionais da confiança dos responsáveis da mercearia e as pessoas deixavam na mercearia o seu requerimento, tarefa que precisavam e horário preferido para os receber em casa. Entre esses serviços estavam jardineiros, picheleiros, electricistas e assassinos. Se fosse preciso assassinar alguém, bastava requisitar o assassino, os detalhes eram tratados directamente com ele, para não levantar grandes ondas;
- Muitos estarão a perguntar-se porque raio não coloquei prostitutas na secção dos serviços. A resposta é fácil: porque iria haver uma secção exclusivamente dedicada a esses serviços. O supermercado ia ter moças a uma determinada hora para as pessoas verem como elas eram e, quem quisesse, marcava hora para estar com elas (sendo que até podia ser logo ali na mercearia para os menos envergonhados). Assim, evitava-se ter de comprar o jornal, gastar dinheiro do telemóvel e gastar gasolina à procura de algo que estava mesmo ali à mãe de semear, sem enganos e sem fotos sacadas na net;
- Mercearia que se preze tem um moço que sabe responder a todas as dúvidas que as pessoas tenham no dia-a-dia. Assim, investia-se numa secção de esclarecimento dúvidas, para evitar sobrecarregar o moço da caixa ou o responsável. Este departamento, estava situado num canto da mercearia e as pessoas pagavam 50 ou 60 cêntimos, como se fosse uma chamada telefónica, para verem as suas dúvidas desfeitas. Caso a pessoa não soubesse responder à dúvida colocada, devolvia o dinheiro e era imediatamente despedida e podia ser espancada pela pessoa cuja dúvida não foi desfeita (mas aí, teria de pagar 10€ à mercearia);
- Diz-se que se deve preservar os mercados tradicionais. Não há mercado mais tradicional que o mercado negro. Assim, a mercearia do futuro teria uma secção exclusivamente relacionada com actividades do mercado negro como venda de bilhetes para eventos desportivos ou concertos, venda de armas e transplante de órgãos. Neste último, os órgão iam diferenciar-se do dos hospitais por serem órgãos de marca branca;
- Esta secção do mercado negro teria uma sub-secção especificamente confinada ao processo de adopção de crianças. Esta adopção estava aberta a casais hetero e homossexuais, importava era fazer lucro com isso, quer fosse da maneira certa ou da maneira errada. Os que eram pais biológicos e apanhavam crianças na escola dos filhos que tinham sido adoptadas por este serviço iam, com desprezo, dizer coisas do género «pois, eu vi logo que um malcriado desses só podia ser de supermercado». É que nem diziam «de mercearia» para acentuarem o desprezo que sentiam;
- Em actividades mais lícitas e que não fizesse com que ninguém fosse preso, uma das minhas sugestões mais pessoais era a abertura de fóruns de discussão, abertos a quem quisesse participar. Imagino já, ia eu às compras e via que o fórum desse dia era sobre debater sobre se o Martini é uma bebida de mulher ou se apenas pode ser considerado como tal se levar gelo e for tomado sob outra circunstância sem ser antes de comer. Ficava ali duas horas e quando chegasse a casa já era hora de lanchar;
- Por último, uma coisa importantíssima para a mercearia do futuro era ter correctores de apostas, que recebessem, registassem e cobrassem as apostas. Este serviço ia ser maravilhoso para quem não se quisesse dar ao trabalho de registar em sites e estar agarrado à Internet. Assim, tinha a pay-shop onde registava o Euromilhões, pagava as Scuts, ouvia aquela moça jeitosa a dizer o número dela para carregar o telemóvel enquanto apontava e, ao lado, apostava nos jogos, com o supermercado a ditar as probabilidades ou aquilo a que eles chamam as «odds».
Eu ia a uma mercearia destas. Aliás, se tivesse uma esplanada como alguns supermercados já têm (já que os super-mercados copiaram as mercearias, a lei também pode ser usada ao contrário!) e os finos fossem a 1€, passava lá os dias. Já disse ao Rebelo para aceitar apostas na mercearia dele, que da lista de cima só lhe falta praticamente isso. É amigo do Ramalho Drogas, conhece sempre alguém que recomenda para qualquer serviço, sabe quem são as melhores moças porcas, responde às dúvidas todas e quando demora a atender um cliente, os que estão à espera fazem ali um belo fórum. Mas o Rebelo diz que não quer nada com apostas, que teve Estatística no curso profissional que fez e andou lá 3 anos para nunca ter positiva e acabou por desistir do curso. Na altura, isso não lhe fez perder muito dinheiro, mas se com este passado se metesse nas apostas, ia perder o dinheiro todo que lhe tinha custado tanto a ganhar e o outro todo que ganhou facilmente de se enganar nos trocos e das gorjetas das moças estrangeiras.
P.S.: Por falar em mercearias, outra coisa que os ajudava era simplificar os nomes e as coisas. Por exemplo, no outro dia, na mercearia do Rebelo, havia iogurtes de frutos do bosque, de frutos silvestres, de frutos tropicais, de frutos polares, de frutos campestres e de frutos vermelhos. Os frutos polares e os campestres fui eu que inventei, mas à primeira vista até passavam, são iguais aos outros. Uma pessoa sabe que são frutos mas não sabe quais são, tem que ir ao rótulo ver os ingredientes e ter surpresas como no Bongo de Frutos Tropicais que leva Laranja. Sim, laranja é extremamente tropical. Agora kiwis e mangas é que são frutos tradicionais, que crescem em qualquer bosque e no quintal de qualquer um que se chame Silvestre.
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