Por esta altura, algum de vocês mais atento, mais mesquinho, mais exigente, mais perfeccionista e mais implicativo perguntaria porque é que pus «pessoa normal» e não «moço normal» no título. O que eu digo é que essa pergunta é tão mesquinha, tão exigente, tão perfeccionista e tão implicativa que até parece que fui eu que a fiz a mim mesmo e não nenhum de vocês. No entanto, o Ramalho Drogas garantiu-me que com os anti-psicóticos que ele me orientava ia deixar de fazer perguntas a mim mesmo e a responder como se tivesse sido outra pessoa a perguntar-me. Sinto algumas saudades de conversar comigo sem saber que o estava fazer, sempre era mais imprevisível do que falar com o Jorge Abel que agora, mais tarde ou mais cedo, ou fala da Xana da cantina ou fala do Sebastião.
Os mais previsíveis de vocês os 3 devem estar a perguntar-se o que é que eu entendo por pensador social. Desta vez vou fazer-vos a vontade e responder à vossa pergunta, ainda que tenha sido eu a fazê-la por vocês. Para mim, um pensador social é aquela pessoa que gosta de falar para os que estão consigo como se estivesse a falar em público, reflectindo sobre tudo o que o rodeia, sempre com uma perspectiva crítica relativamente às atitudes de outros (que não necessariamente os envolvidos na conversa) e numa perspectiva de auto-valorização. Os pensadores sociais encontram-se facilmente em lojas do cidadão, em talhos, em supermercados, em transportes públicos, em programas de televisão onde se recebam chamadas telefónicas, nas redes sociais e em locais onde normalmente exista muita gente e se esteja ou à espera de ser atendido ou à espera de chegar a um destino.
Digo pensador social porque os que pensam sobre a sociedade têm nomes próprios e científicos. Pensador social é um nome tendencialmente depreciativo que qualquer criança ou comido do cérebro podia facilmente inventar. E, por isso, hoje vou explorar a diferença entre ser um pensador social e uma pessoa normal:
- Uma pessoa normal exprime as suas opiniões sabendo que outras pessoas poderão pensar de maneira diferente. Um pensador social exprime as suas verdades absolutas sabendo que outras pessoas poderão estar completamente erradas ao ter uma perspectiva diferente;
- Uma pessoa normal fala para ser ouvida pelas pesssoas que estão consigo. Um pensador social fala para que o máximo de pessoas possível ao seu alcance o consiga ouvir, mesmo que não tenham nada a ver com a conversa e não queiram ouvir. Eventualmente, um pensador social pode interpelar os outros, alheios à conversa, com um «não acha?»;
- Uma pessoa normal procura que os outros concordem consigo e validem as suas opiniões. Um pensador social procura ser idolatrado e que as pessoas ao seu redor vão para casa a pensar «isto sim é um exemplo para a humanidade»;
- Uma pessoa normal tem opinião sobre alguns temas e sobre outros não fala ou reconhece que tem limitações. Um pensador social é perito em todas as áreas possíveis e tem sempre uma opinião sobre qualquer tema, através da qual consegue ensinar alguma coisa aos outros;
- Uma pessoa normal procura conversar com os outros, ouvindo e falando. Um pensador social procura ensinar sempre alguma coisa aos outros, onde as interacções dos outros são uma pausa forçada no seu discurso;
- Uma pessoa normal fala de coisas que faz bem e de coisas que faz mal, numa espécie de equilíbrio. Um pensador social fala de coisas que faz bem e de coisas que os outros fazem mal, também equilibradamente;
- Uma pessoa normal sabe que pode sempre aprender com os outros. Um pensador social sabe que os outros podem sempre aprender consigo;
- Uma pessoa normal não tem noção que às vezes fala demais e depois arrepende-se. Um pensador social não tem noção que fala sempre demais e apenas se arrepende de não ter dito mais qualquer coisa.
Tendo em conta este último ponto poderia pensar-se que o Jorge Abel era um pensador social, mas falha nos outros critérios todos, até porque no outro dia, estava a discutir especificidades do Godzilla com o Tolentino e perguntei ao Jorge Abel se ele achava que o Godzilla tinha surgido dos testes nucleares que os franceses fizeram na Polinésia Francesa ou se foram os americanos que andaram para lá a fazer cagada e depois culparam os franceses. O Jorge Abel disse-me que nunca tinha pensado nisso mas que God em inglês significava «bom». Portanto, nunca um moço destes poderia ser considerado um pensador social, ainda que alguns dos pensadores sociais que apanho por aí (principalmente os de fila de super-mercado e os de paragem do autocarro) tenham uma capacidade mental e intelectual semelhante à do Jorge Abel. E também não viram o Godzilla nem sabem opinar satisfatoriamente sobre esse tema.
P.S.: A Paulinha já viu o Godzilla. Duas vezes. A primeira foi para ver o filme em si, a segunda foi para eu fazer «pause» e comentar alguns aspectos do filme com ela. Ao início não achou muita piada mas depois adormeceu a meio do filme e descansou ela e diverti-me eu, que foi muito melhor fazer os comentários logo no momento, sem precisar de fazer «pause» e explicar tudo direitinho. Amanhã no COJDIV podia haver uma convenção sobre que tipo de peixe preferiria o Godzilla ou sobre as implicações económico-sociais do Godzilla existir e qual a possibilidade dele poder aparecer durante algum jogo do Mundial 2014 e qual o impacto que isso teria para a competição. Mas o Tolentino já me disse que é alguma coisa sobre a prevalência dos nomes italianos para os anúncios de acompanhantes em sites da Internet.
Sem comentários:
Enviar um comentário