quarta-feira, 16 de outubro de 2013

A Rosa nunca mais me diz o que sente por mim e eu estou a ver a minha vida a andar para trás


Quer dizer, na prática não estou. Nem sei o que é ver a minha vida a andar para trás. A única vez que vi a minha vida a andar para trás foi quando o meu tio se pôs a ver uma cassete da minha festa de anos, quando fiz 7 anos, para mostrar à minha tia que já usava um penteado à moicano nos anos 90. O meu tio diz que foi ele que inventou essa moda, que andava assim na rua com o cabelo e algum cabeleireiro o deve ter visto a passar e começou a fazer isso aos jogadores de futebol. Mas achei piada à metáfora. Ouvi o Rebelo a contar uma história quando fui lá buscar um pacote de açúcar e a dizer que tinha visto a vida dele a andar para trás. Perguntei-lhe o que queria dizer com aquela metáfora e ele pediu-me 80 cêntimos pelo açúcar. À vinda para casa passei por um supermercado e o açúcar de lá custava 1€. Imagino que se não lhe tivesse dito que tinha gostado da metáfora me levava 1€, como no supermercado. O Gary disse-me que uma vez uma moça foi fazer compras à mercearia do Rebelo e só por ter dormido com ele na noite anterior não pagou nada.



Eu é que gostava de dormir com a Rosa. Mas era só dormir, atenção. Não sou daqueles que só pensam em sexo e em desonrar as moças a qualquer custo. O meu tio uma vez disse-me que não era mau pensar em sexo quando estou com uma moça, que mau era pensar em fazer sexo com uma moça quando estou a meio de uma entrevista de emprego. O Gary disse-me que não sabia o que era uma entrevista de emprego. O Júlio César disse-me que nunca pensou em fazer sexo com nenhuma moça porque sempre lhe disseram que o que acontecia mais vezes era o inesperado. Realmente o Júlio César tem razão, eu nunca penso que roupa vou vestir e ando todos os dias vestido. O meu tio disse-me que andar nu na rua dá cadeia mas o meu patrão uma vez saiu nu do escritório dele a meio da tarde e o Venâncio disse-me que às quartas-feiras era normalíssimo. A Xana da cantina disse-me que se eu quisesse andar nu em casa dela podia fazê-lo todos os dias. Agradeci-lhe, mas ainda esta semana comprei um casaco novo, era um desperdício andar nu depois de estourar uns 80 euros naquilo. 



Mas vou falar da Rosa. No outro dia mandei-lhe mensagem a dizer «Bom dia» e ela nem me respondeu. O Venâncio disse-me que para evitar que uma moça não lhe responda, em todas as mensagens que manda faz uma pergunta. Assim, se a moça não responder, ele diz que pode ir dormir descansado, que foi a moça que não lhe respondeu à pergunta. Segundo o Venâncio, há mensagens que as moças, se quiserem, não precisam de responder. Vem no Código Penal das moças. O Venâncio disse-me que entre outras coisas que vem nesse livro está o direito de processarem um caixa de supermercado se fizer um olhar reprovador quando elas compram um montão de chocolate e gelados. Perguntei ao Venâncio se ele me podia emprestar esse livro, mas ele disse-me que era grandão e que mais valia ler daqueles livros coloridos com dinossauros ou o Astérix. O meu tio disse-me que o Astérix era um livro onde só aparecia uma mulher de 10 em 10 páginas e era sempre a mesma. O Júlio César disse-me que nunca leu o Astérix porque se sente insultado em todas as falas.



Depois da Rosa não me responder nem me disse nada. Fiquei triste com isso. Ao almoço perguntei à Xana da cantina se ela alguma vez tinha deixado alguém sem resposta. Disse-me que não, mas que se eu quisesse me deixava sem fôlego. Disse-lhe que ela já me deixava sem fôlego quando ao almoço na fábrica eram bifanas, que a Xana fá-las bem picantes. A Xana da cantina disse-me que se eu gostava das bifanas picantes, ia adorar a fêvera picante dela. Perguntei-lhe se não podia fazer para o almoço na fábrica, mas ela disse-me que se eu quisesse me fazia ao jantar, em casa dela. Um dia talvez vá lá experimentar. Perguntei-lhe se o Júlio César também podia ir e ela disse-me que era um bocado cedo para fazer esses pedidos mas que podíamos experimentar. Não percebi esta última, talvez não tenha cadeiras ou pratos para três pessoas. O Venâncio disse-me que a única vez que tentou perceber o que ia na cabeça de uma moça desistiu passados 5 minutos e foi jogar bilhar com o primo dele. Azar o meu que não sei jogar bilhar, tenho de me contentar em tentar perceber as moças. 



No outro dia na rua vi o Gary a sair de casa da Paulinha. Perguntei-lhe o que tinha ido lá fazer e ele disse-me que tinha ido lá lanchar. Eram 7:30 da manhã. Perguntei-lhe se não tinha ido lá tomar o pequeno-almoço. Ele disse-me que não, que tinha ido lá lanchar, mas depois tiveram relações sexuais e ele ficou lá a dormir e saiu sem tomar o pequeno-almoço porque lhe apetecia Chocapic e a Paulinha só tinha Chocapic Duo. Quando o Gary disse isto deu-me uma dor no coração. A Rosa detestava Chocapic Duo e eu, só para lhe agradar, tive que dizer que também detestava. Que saudades que tenho de comer Chocapic Duo. A Xana da cantina disse-me que os cereais preferidos dela são os Nesquick porque ela é amante das rapidinhas. O Venâncio disse-me que para ele não havia melhores cereais que os Cheerios, porque eram um porradão deles e apesar de parecerem todos iguais, eram todos diferentes. Mais ou menos como os asiáticos, que qualquer pessoa que tem olhos em bico parece chinês mas depois vai-se a ver e é coreano ou japonês. A Rosa é que gostava de comida japonesa, lá do sushi ou que raio era aquilo. Tenho saudades da Rosa. Também tenho saudades de comer um rissol de carne. Provavelmente, mais depressa como um rissol. 






P.S.: Disseram-me que ando poético nos meus últimos textos, com frases profundas. Isso fez-me pensar e escrevi um poema. Olha vejam lá se gostam, é daqueles que não rimam como o Fernando Pessoa ou como o Andrade das Finanças: Oh mosca que voas, tenho que te dizer que te invejo; és livre de movimentos como eu gostava de ser livre de pensamentos; não sei o que fazer. Tu também não, no entanto voas. Voas como se fosses feliz, uma felicidade tão impossível para ti como é para mim. A diferença é que tu não sabes, mas eu sei. Tenho saudades de comer Chocapic Duo, uma vez encontrei uma mosca, como tu, dentro do plástico do Chocapic Duo. Comi na mesma, mas não me soube diferente. A que sabe a tua carne, mosca? Outra vez ia a correr e engoli uma mosca e também não me soube a nada. Serás tu vazia de sabor como eu sou de felicidade? Voa, mosca, voa, que amanhã será diferente. 


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